terça-feira, maio 01, 2007

A esperança veste-se de verde

Agosto de 2005: o que parecia impossível, aconteceu...o coração da Estrela, o vale glaciar do Zêzere, arde durante 3 dias...

Vale glaciar do Zêzere - Abril de 2007

Precisei de mais de um ano para arranjar coragem e lá voltar...não quero menorizar os incêndios, como o do ano passado em Famalicão da Serra, onde se perderam vidas humanas...6 vidas humanas!

Em qualquer incêndio há sempre perdas ambientais, mesmo que num pinhal ou eucaliptal; em cada incêndio, ainda que não se percam vidas humanas, há perdas materiais...alguém que perde as suas posses, muitas vezes a sua casa.

Não vou dizer que compreendo, porque só quem sente esse inferno directamente na pele o pode verdadeiramente compreender...

Encostas do vale do Zêzere

Há no entanto certos sítios que pelo incalculável valor ambiental e paisagístico que encerram, deveriam ser poupados ao massacre anual das florestas portuguesas. Sim, porque a paisagem também faz parte do património colectivo de um povo.

O vale do Zêzere, tal como a Mata do Ramiscal no Parque Nacional da Peneda-Gerês, estão com certeza nesta lista...como está a Mata de Albergaria (também no Gerês), a Mata da Margaraça (na Serra do Açor) ou a Mata do Solitário (na Arrábida), por exemplo.

Que povo é este que é absolutamente incapaz de defender o pouco que resta do seu património natural? E alguém se importa com isso?

Uma tramazeira (Sorbus aucuparia L.) que renasce...

Por incrível que pareça, a resposta é "sim"... Ainda há portugueses que se interessam e a campanha "1 milhão de carvalhos para a Serra da Estrela" é bem a prova disso.

Uma resposta que nasceu da sociedade civil que, pela primeira vez, não esteve à espera do Estado para actuar...Só por isso, que já é tanto, teria valido a pena!

Teixo (Taxus baccata L.)

A própria Natureza está a renascer do pesadelo. Uma Natureza que, por intervenção de algum Deus mais bondoso, poupou (parcialmente) o que de mais sagrado existe nesse vale, um conjunto de teixos centenários...talvez o último núcleo desta espécie, não apenas na Estrela mas também no Gerês, onde não se encontram mais do que exemplares isolados.

Seremos capazes de os proteger? Receio a resposta, ainda temos muito a evoluir como povo, estamos ainda na adolescência no que concerne ao desenvolvimento de uma atitude colectiva que valorize o nosso património natural e o salvaguarde para usufruto das gerações futuras.

Gerações não apenas de portuguesas, porque este vale é verdadeiramente património de toda a Humanidade.

7 comentários:

Paulo Araújo disse...

Excelente foto a desses teixos que escaparam aos incêndios. Agora já acredito que ainda existem teixos espontâneos de bom porte em Portugal. Oxalá estejam para durar.

TPais disse...

Pedro, a segunda foto ilustra bem o poder de um incendio!Repar-se bem que o próprio solo desapareceu da zona ardida em comparação com a imediatamente adjacente!A regeneração natural faz parte do processo de recuperação, no entanto, quando torrentes de chuva se abatem como neste Outono, todo este esforço se esvai e torna impossivel este processo. São toneladas de solo que demoram dezenas de anos a formar a serem varridas da encosta em algumas horas!
Excelente artigo Pedro.
Abraço

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

Paulo,

Este pequeno bosque (porque infelizmente é mesmo muito pequeno) tem algo de mágico que é impossível descrever...qualquer pessoa que goste de Natureza e de árvores, em particular, não pode deixar de ficar emocionada por estar diante dos últimos testemunhos de um passado que parece estar a desaparecer....

Apesar de haver muita gente empenhada na defesa destes teixos, a própria evolução climática (com ou sem interferênca humana) parece jogar contra a sobrevivência desta espécie vegetal.

Mas a "magia" ainda está lá à espera de quem a queira "ver"!

Abraço



Tiago,

Não sei se te recordas de uma pequena zona ardida logo abaixo do Poio do Judeu, precisamente virada para o Covão d'ametade...hoje essa zona é imperceptível pois ficou ligada à zona que ardeu em 2005.

Falo nela porque, em 2005 (antes do incêndio), essa pequena zona que já tinha ardido uns 4 ou 5 anos antes, continuava exactamente na mesma. De facto, estamos a falar de zonas com solos esqueléticos, ainda por cima em encostas com grande declive e onde a chuva tem um efeito erosivo brutal.

Por isso concordo que a regeneração natural é aqui insuficiente e o homem tem que intervir directamente, plantando árvores, matos e com outro tipo de iniciativas que travem a erosão...

Se calhar estou a ser injusto, mas se a Serra da Estrela ficasse perto de Lisboa talvez se tomassem decisões mais rápidas...o tempo aqui é muito importante, porque a chuvada de um dia pode arrastar o que levou centenas de anos a formar-se.

Seria bom que a campanha "1 milhão de carvalhos..." continuasse, por todos estes motivos, a insistir neste local.

Abraço

teresa g. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
teresa g. disse...

É mais um que vou imprimir para dar ao meu presidente da junta ;)
Água mole em pedra dura...
Obrigada!

ljma disse...

O que mais esperança me dá nesta história do vale do Zêzere é notar que muitas bétulas que arderam estão agora em recuperação, quer através de novos botões em ramos velhos, quer (talvez nos casos mais graves em que o tronco exposto ao fogo morreu totalmente) através de ramos novos que partem da base do tronco.
Mesmo assim, aqui do alto da minha ignorância, parece-me que a regeneração natural deve ser ajudada, porque é muito lenta. Veja-se o exemplo da encosta da Covilhã, que ardeu no início dos anos noventa. Só agora começa a mostrar bosquetes que se vejam, e quase todos constituídos por árvores muito jovens. Felizmente, o que está a crescer nesta encosta é muito mais variado do que a mancha quase homogénea de pinheiro bravo que antes tínhamos. Infelizmente, parte dessa variedade vem das malditas mimosas, especialmente nas cotas mais baixas...

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

Jardineira,

Qualquer dia sou persona non grata na tua freguesia :)

Bjs


José,

Estou de acordo 100%; em territórios de encosta, sujeitos a elevada pluviosidade e com solos esqueléticos, temos que dar uma ajuda à Natureza.

Apesar de teres razão no grande aumento de variedade dendrológica nas encostas da Covilhã, na minha opinião deveria reduzir-se um pouco mais a área de pinhal...e, sobretudo, fazer alguma coisa para controlar a expansão das mimosas...aliás, existe um exemplar, na subida do lado direito (na curva que antecede o parque do Pião) que eu próprio hei-de arrancar!

E outro núcleo de mimosas antes da saída para a Rosa Negra, imperceptível da estrada quando se sobe, mas bem visível quando se desce...é um daqueles pequenos núcleos que se vai alargando...Na zona da Floresta também existem outras acácias mas essas estão mais controladas. Até ver...


Abraço