O "Público" da última Sexta-feira trazia, com chamada à 1ª página, um alerta (utilizando a expressão do diário) da Portucel: "Madeira nacional só cobre metade da procura das celuloses".
Resumidamente, o problema é o seguinte:
- As florestas (entenda-se por florestas as matas de eucaliptos) nacionais não vão conseguir corresponder às necessidades das celuloses. Resta a importação, mais cara e que oferece menos qualidade.
Parece-me a mim que, mesmo num sector onde Portugal gosta de se considerar na vanguarda, subsistem alguns tiques tipicamente lusitanos, como a falta de planeamento a médio e longo prazo, se não vejamos: primeiro, a indústria anuncia avultados investimentos para aumentar a produção, de seguida apercebe-se que o volume total (de madeira de eucalipto) decresceu em Portugal, nos últimos anos, cerca de 5,4 milhões de metros cúbicos.
Mais uma magistral lição de planeamento e estratégia à portuguesa!
- Claro que a anterior constatação pressupõe a procura de soluções; está bem de ver o que estes senhores propõem: plantar mais eucaliptos. Magistral! Sobretudo se atendermos ao facto de que nos últimos dez anos arderam 119 000 hectares de eucalipto.
Vamos lá a ver se nos entendemos...não vou desatar numa fúria fundamentalista anti-eucalipto, mas há hoje alguns pontos que me parecem inquestionáveis:
- nos últimos anos, a área coberta por eucalipto cresceu desmesuradamente em muitas zonas do nosso país, ocupando, em muitos casos, terrenos sem a mínima aptidão para a espécie e, noutros, ocupando solos de elevada capacidade agrícola;
- o eucalipto promove o despovoamento do que resta do nosso mundo rural (é uma cultura que não exige praticamente nenhum tipo de manutenção e da qual não se retiram outros produtos) e a desertificação dos solos (nomeadamente através de desastrosas técnicas de movimentação de solos aquando da plantação - ver fotos);
- apesar dos milhões gastos pela indústria, nomeadamente na vigilância das matas privadas de eucaliptos, estas têm sido devoradas pelas chamas; num país com um clima mediterrânico, quando o Verão atinge o pico do estio é difícil controlar a situação (em Agosto passado chegaram a ocorrer mais de 500 ignições simultâneas...); claro que a isto se junta, a falta de planeamento florestal e o desordenamento do território (litoral caótico; interior abandonado).
Agora, sejamos honestos...num eucaliptal, dada a elevada produção de óleos essenciais altamente inflamáveis que esta espécie produz, se um incêndio atinge determinadas proporções, nada o detém! Vejam o que aconteceu o Verão passado na Serra de Ossa ou há dois anos em Coimbra! Venham lá os aviões que vierem, só não vê quem não quer ver...
- apesar deste diagnóstico, concordo que a indústria da celulose, os rendimentos que gera para o país e os empregos que promove, são fundamentais para Portugal. Mas esta não pode continuar a procurar sustentar-se no que é, ambiental e economicamente inviável, ou seja, a expansão do eucaliptal no nosso país.
Com certeza que, em certas condições, há espaço para esta espécie em determinados locais mas promover o continuar da expansão desta espécie (nas palavras do "Público" para "solos agrícolas mais férteis...") é não ter ainda percebido nada...depois de milhares de hectares calcinados, de vidas humanas perdidas, não se compreendeu ainda o essencial da questão.
Claro que também não defendo que sustentemos a indústria nacional de celulose com base na eucaliptização de países do chamado 3º mundo (ainda que cada vez mais tenha a certeza de que também pertencemos a esse mundo...).
Se a indústria de celulose tem um problema de sustentabilidade, que arranje os gestores capazes de lhe dar uma resposta à altura e não propondo soluções ruinosas para o ambiente (e para a economia) deste país...a "indústria nacional de piroverões" não precisa de mais ajudas, é já hoje um negócio bem pujante!
Logo no dia seguinte em que saiu esta notícia do público, saiu, no mesmo jornal, uma declaração da Federiação de Produtores Florestais de Portugal que dizia que o problema é que as celuloses compravam a madeira tão barata que os produtores preferiam vendê-la a espanhóis. Se é verdade ou não, não sei, mas lá que era o que diziam, era.
ResponderEliminarOutro assunto, relacionado com este, mas só à tangente, na escandinávia usam madeira de bétula para fazer pasta de papel. Bem sei que as bétulas escandinavas podem não ser como as portuguesas, e que esta árvore não cresce em todo o território nacional. Mas cresce na serra da estrela, desde a base a 700m até aos 1500m ou perto disso. E é também uma árvore de crescimento bastante rápido (em comparação com os carvalhos, pelo menos). Talvez não seja boa ideia, mas, monocultura por monocultura, acho que as encostas de Unhais e Alvoco ficavam muito melhor servidas com bétulas do que a Serra do Buçaco com os eucaliptos...
De facto, a maioria das monoculturas (nomeadamente criadas por acção do ser humano) acaba sempre por ter alguns efeitos negativos ao nível da biodiversidade. Mas a utilização de espécies autóctones, como a Betula alba, poderia ser uma das soluções; ou seja, diversificar ao máximo as fontes de madeira.
ResponderEliminarClaro que não sou ingénuo e sei que as fábricas de celulose nacionais estão preparadas para o pinheiro-bravo e, sobretudo, o eucalipto; e que, reconverter essa estrutura produtiva, custaria milhões...e que provavelmente, a pasta obtida não seria de tão boa qualidade.
Mas não consigo ver outro tipo de alternativa a longo prazo; a monocultura de eucalipto já provou o que tem para dar a Portugal: piroverões.
Penso até que se se apostasse na diversificação e no uso de espécies autóctones, criando bosques ecologicamente sustentáveis, se poderia criar uma marca diferenciadora pela qualidade; sobretudo, num mercado como o europeu,que já valoriza essas questões.
Mas falta-nos essa visão estratégica de médio/longo prazo; só vemos o lucro fácil e rápido e a competitividade pelo preço barato e não pela qualidade (do produto e ambiental).
Acho que, no fundo, mesmo as "celuloses" perceberam já que a monocultura do eucalipto em Portugal se esgotou; penso é que a estratégia vai ser eucaliptizar vastas zonas de África e da América do Sul.
O eucalipto foi apresentado como o "petróleo verde " português, aqui há uns anos para justificar a sua plantação em massa.
ResponderEliminarPrimeiro que tudo, acho que se enganaram na cor! Quando arde (o que acontece frequentemente), não é verde, mas sim vermelho !!!
Há ainda outros aspectos que importa focar: o eucalipto empobrece o solo, já que ao ir buscar água a níveis mais profundos, devido ás suas raízes, impede o desenvolvimento de qualquer outra planta; o eucalipto seca os terrenos onde está plantado (é curioso como logo após os grandes incêndios de Monchique, há uns anos atrás, em pleno Verão,que queimaram grandes matas de eucalipto, voltaram a brotar fontes, há muito secas !!!).
Outra informação ainda para terminar: uma plantação de eucalipto é cortada (se não arder entretanto) em cada 8 a 10 anos e volta a rebentar, só que de cada vez que renasce o seu valor económico é inferior ao valor da anterior plantação, porque nascem com mais ramificações e sem o diametro ideal. Isto é de tal forma, que ao fim de algumas séries, o eucalipto deixa de ter valor económico e é abandonado, pois o custo da retirada das raízes profundamente enterradas é excessivo e o solo entretanto já está tão empobrecido e seco, que já pouco ou nenhum interesse económico tem.
Assim se pode ver com o anunciado "petróleo verde" é afinal uma praga de grandes proporções .
Não andarás tu, meu cabrão, a deitar fogo às serras?
ResponderEliminarCara Dona Antónia (caso seja este o seu nome real);
ResponderEliminarPoderia ter optado por ignorar o seu "comentário"; e repare que já estou a elevar a sua frase ao estatuto de um comentário.
Poderia apenas ter-me limitado a excluí-lo do meu blogue.
No entanto, todos os blogues, necessitam de um pouco de humor...ainda que delirante.
Devo confessar que não estava à espera de um dia vir a ter a honra de ter uma leitora tão arguta e perspicaz...receio não estar ao nível do seu intelecto!
Confesso que me "apanhou"! É verdade, sou eu o malandro que ando a deitar fogo às serras; já agora, sou também eu o responsável pelas podas das árvores (para depois poder escrever sobre elas); pelo aquecimento global; pela poluição dos rios e pela destruição do litoral...
Se sua excelência assim o desejar, serei eu o responsável por todos os males deste país e do mundo. Apenas recuso a culpa de um deles...o da SUA falta de educação! Por essa, lamento, mas a Dona Antónia terá que procurar outros responsáveis.
Apesar deste pequeno incidente mantenho o desejo de não censurar à priori quem queira escrever um comentário neste blogue...todos têm direito à sua opinião e sobretudo porque "esta" diz muito de quem a escreve.
Com os melhores cumprimentos